por Osvaldo Duarte
Para quê serviu a filosofia?
Para quê serviu a filosofia?
A Filosofia serviu durante algum tempo de consoladora, um verdadeiro bálsamo para as almas sofridas!
Na Itália no tempo de Epicteto, o filósofo era rudemente tratado e, somente mais tarde é que se torna companheiro (comes), conhecido também, como filósofo doméstico.
Já na época do imperador Antonino (138-161), alguns filósofos gozavam de boa reputação, ocupando cargos públicos, tendo inclusive, seus retratos entre os deuses Lares, erguiam-lhes estátuas e, quando do aniversário de sua morte, seu túmulo era ornamentado com flores.
Antonino transfere a estátua em ouro da deusa Fortuna para os aposentos do seu sucessor Marco-Aurélio (161-180), e no dia 07 de março de 161, expira.
O novo imperador era estóico, e dizia do seu mestre Júnio Rústico: “Por ele conheci as lições de Epicteto, que me emprestou da sua biblioteca”.
O amor pela Filosofia leva o imperador Marco-Aurélio a convidar filósofos afamados do mundo inteiro e de diversas Escolas concedendo-lhes privilégios. O povo não só dizia que tais privilégios eram a expensas da República, como também, zombavam dos filósofos convidados, rindo dos seus cabelos mal penteados, das barbas e das suas unhas.
Embora a maior parte da população reclamasse do Imperador Marco-Aurélio - “Quer-nos tirar nossos divertimentos para nos obrigar a filosofar,” quando este tentou suprimir as lutas dos gladiadores, outra parte recorria à Filosofia para aliviar seus sofrimentos ou instruir-se.
O filósofo usava seu manto com dignidade e desempenhava o papel de conselheiro, amigo íntimo e guardião de alma. Incentivava o homem a esperar a morte com coragem; o moribundo conversava com o sábio para que seu último instante tivesse um caráter moral. Muitos recorriam à Filosofia quando o desespero, o infortúnio, a doença e a infelicidade entre outros, lhe batiam à porta.
“Não se compram os remédios senão quando se está gravemente enfermo: despreza-se a filosofia enquanto se não é desgraçado. Vede esse homem rico, gozando de boa saúde, com uma mulher forte e filhos sadios; bem se importa ele com a filosofia; mas, venha ele a perder a fortuna ou a saúde, adoeça-lhe, com doença mortal, a mulher, ou o filho, ou irmão e só assim se lembrará de chamar o filósofo para que o console, para que lhe ensine a suportar tenta desgraça”.
Augusto tinha Areu como diretor, conselheiro e confessor. Lívia quando perde o seu filho Druso, Areu é quem a consola. Até mesmo Sêneca desempenhou algumas vezes o papel de filósofo doméstico junto de Nero. Poderíamos narrar ainda outros exemplos, mas não abusaremos da paciência do leitor.
Lúcio Aneu Sêneca nos mostra claramente o papel da Filosofia nesta época:
“Se queres saber o que a filosofia traz de útil à humanidade, dir-te-ei: os seus preceitos. Há homens que estão às portas da morte, outros a quem a miséria atormenta, outros a quem tortura a riqueza própria ou alheia; uns afligem-se com a má sorte, outros desejariam escapar aos excessos de bem estar, uns são detestados pelos homens, outros pelos deuses. Para quê fazer frioleiras daquelas? Não é altura de brincar: importa é ajudar os desgraçados. Prometeste prestar auxílio aos náufragos, aos cativos, aos doentes, aos miseráveis, aos condenados sobre cujo pescoço já impende o machado: porque te distrais? Que vais fazer? Este homem está cheio de medo, em vez de brincar ajuda-o a libertar-se dos seus temores. De todo o lado, todos erguem para ti as mãos, pedem auxílio para a sua vida sem rumo e sem futuro, toda a sua esperança de socorro está em ti; pedem-te que os libertes do turbilhão que os consome, que mostres a clara luz da verdade a quem anda perdido à deriva.”
A Filosofia era o último refúgio dos desesperados, servia de consoladora aos desolados, de conselheira aos desorientados, tinha como papel fundamental confortar as almas sofredoras. Era dever do filósofo doméstico esclarecer os homens e dirigi-los até o último momento. Com o tempo o ofício do filósofo deixa de ser diretor de consciência, a religião passa a ocupar o lugar da Filosofia, e assim:
“A profissão do filósofo doméstico rebaixou-se imenso com o tempo. No mosaico Pompeano, descoberto em Atmenia na província de Constantina, mosaico do tempo de Honório, o filósofo não desempenha outra função além de levar o guarda-sol da sua senhora e de lhe passear o cãozinho.”
SÊNECA, L. A., Cartas a Lucílio. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2009.
RENAN, E., Marco-Aurélio e o fim do mudo antigo. Porto: Lélo e Irmão, Ltda, 1925
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Por favor, deixe seu comentário: