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Pansophia

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domingo, 27 de dezembro de 2015

RACISMO AO EXTREMO



por  Leandro Morena

                                   

Ao longo dos séculos o corpo humano sempre despertou a curiosidade do homem. Na história da medicina, desde a Grécia antiga o médico Hipócrates (460 a.C .-377 a.C.) já debruçava-se para entender a anatomia do corpo humano e dedicava-se aos estudos das epidemias. Foi Hipócrates quem criou o juramento dos médicos que vigora até os dias atuais. O filósofo francês René Descartes (1596-1650) afirmava em seu pensamento de que o corpo humano é uma máquina perfeita e movimenta-se através de engrenagens, além disso, o pensamento cartesiano elaborou alguns escritos de medicina entre eles a descrição da circulação do sangue. Quando a anatomia humana começou intensificar-se, a medicina voltava-se para descobrir a causa das enfermidades. Muitas vezes seres humanos foram colocados a mercê de testes para descobrir vacinas e drogas que poderiam ajudar a combater tais enfermidades. É lógico que leis internacionais obrigaram os cientistas praticar experimentação em seres humanos somente com o consentimento do próprio voluntário, pois uma pesquisa experimental precisa em primeiro lugar ser ética. Diferentemente disso, é um processo criminoso, colocar a vida do indivíduo em risco sem que o próprio saiba do que se trata. Um exemplo criminoso disso foi os experimentos nazistas em seres humanos que levou a mortandade de milhares de vítimas. 




Os voluntários de um determinado experimento têm a compreensão total e uma visão detalhada do que vai ocorrer no processo de experimentação. E o que se leva em conta com o voluntário é que não possua problemas psicológicos, que sejam voluntários não por receberem algum tipo de gratificação ou promessas e que não foram coagidos ou obrigados a exporem-se e tenham a compreensão de que nem sempre a experimentação pode ser benéfica a eles. Muitas vezes esses voluntários são precursores do bom desenvolvimento de uma vacina ou remédio, lembrando muito a corrente filosófica do utilitarismo, que o sacrifício de poucos é necessário para o bem estar da maior parte das pessoas. A medicina deu grandes passos, pois descobriu vacinas que erradicaram epidemias e remédios que ajudaram no controle de doenças fazendo com que o ser humano tenha uma vida melhor e longínqua.
Um exemplo contemporâneo de experimentos em voluntários é a futura vacina contra a dengue que está sendo elaborada no Brasil e muitos voluntários estão cadastrados e já estão participando das pesquisas, tudo sendo seguido com o código de ética e tudo conforme a lei determina. Respeitar as pessoas é baseado no pensamento do filósofo Kant (1724-1804) que afirmara  que o homem é um fim em si mesmo e não um meio.
Infelizmente a experimentação em seres humanos também teve seus abusos na trajetória da história. Como afirma o filósofo Nietzsche (1844-1900): “humanos demasiados humanos” existem pesquisadores que romperam com a conduta ética e passaram a exercer e cometer atos ilícitos e esses demasiados humanos praticaram malefícios contra pessoas inocentes.
Os EUA nunca foi um país modelo a se seguir na questão do racismo, pois até os dias de hoje os noticiários vem mostrando episódios de preconceitos e racismo puro, ou contra afrodescendentes, ou contra latinos, ou contra muçulmanos e por aí vai. E na experimentação com seres humanos, esse país foi alvo de um dos maiores escândalos no campo da medicina.
Mesmo antes de ser descoberta a penicilina, a doença sífilis era tratada com drogas que eram injetadas nos pacientes, essas drogas continham metais pesados o que já não é um bom sinal mesmo aos olhos dos leigos em medicina. Essa droga diminuía a morbidade dos pacientes tratados com ela, mas os médicos observaram que os pacientes tinham muitas complicações, pois os experimentadores achavam que fossem complicações da própria doença, mas com o tempo  começou-se a suspeita de que essas complicações poderiam ser da própria droga  injetada nos doentes.


                

Os pesquisadores para entenderem mais o problema dessa droga, resolveram levantar uma nova pesquisa para entender mais o problema dessa doença. Para tais experimentos, a cidade de Tukesgee, localizada no Estado do Alabama foi à escolhida para a experimentação em seres humanos. Os procedimentos éticos foram esquecidos e o preconceito racial e social falou mais alto. As pessoas escolhidas para essa experimentação eram pessoas do campo e paupérrimas, negros (chamo a atenção do leitor que não usarei aqui o termo afrodescendente e sim negro para que o leitor seja induzido a sentir profundamente como esse episódio foi algo de racismo no mais alto grau) A experiência foi da seguinte maneira:  408 pessoas desse grupo que continham a doença simplesmente não foram tratados e outros 192 pacientes, se é que podemos chamar de pacientes e sim o termo apropriado nessa ocasião é cobaia, que não continham a doença, foram usados como tipo de um controle, para ver se esses não sifilíticos poderiam ficar doentes. Todas essas pessoas não sabiam que iriam fazer parte de um experimento  o que torna o crime de proporções  gravíssimas, pois além de  não saberem que eram apenas  cobaias o que fere a ética médica, o racismo fica bem evidenciado.  Não bastasse todos esses crimes, ainda as pessoas foram enganadas pelos experimentadores, pois esses alegaram a elas de que se tratava de um tratamento especial gratuito, e logicamente na inocência dessas pessoas que já sofriam com o preconceito  do racismo no dia a dia, além do descaso do governo, qualquer ato “benéfico”  que lhes fosse oferecido era bem vindo.
A experimentação, ou a carnificina começou no ano de 1932 e era para durar apenas 9 meses e o objetivo inicial foi observar o andamento da doença, mas não foi assim. Os “pesquisadores”  chegaram a dedução ridícula de que os pacientes não tratados com aquela droga tinham maior índice de morbidade e mortandade do que os pacientes  não sifilíticos, e mesmo depois da descoberta da penicilina em 1947, esses pacientes continuavam sem tratamento, apenas observados e lhes foi negado o tratamento inovador que poderia curar e minimizar o sofrimento deles e ainda eram impedidos de procurar outros tratamentos, pois os experimentadores alegavam as vítimas que estas possuíam “sangue ruim”. No ano de 1954 foi publicado um artigo que reforçava essa descoberta,  que a mortalidade dos pacientes sifilíticos não tratados era bem maior do que os não sifilíticos. Muitos morreram, muitas esposas desses pacientes contraíram a doença e muitas crianças nasceram com a doença. Esses criminosos continuaram com esses testes até o ano de 1972, pois nesse mesmo ano um jovem jornalista denunciou o caso que veio a tona na imprensa.  E depois de 40 anos essas experimentações foram suspensas. O leitor deve perguntar-se como levou 40 anos esses experimentos sem que nenhuma autoridade ou nenhum conselho de medicina no país soubessem desses crimes? Imaginem se o repórter não tivesse denunciado? E terrivelmente essas pesquisas foram financiadas pelo Serviço de Saúde Pública dos EUA o que nos leva a crer que eles sabiam desses crimes. Ao longo dos anos, algumas das vítimas que sobreviveram a essa carnificina e descendentes dos mortos, receberam indenizações e pedido de desculpas do governo, mas esse episódio jamais será apagado da história da medicina que envergonhou as pesquisas cientificas que trabalham seriamente e respeitam a ética em suas pesquisas. Tantas foram as vitimas dessas experimentações que o governo americano viu-se acuado e resolveu criar um serviço de proteção de pesquisa humana e leis mais duras para proteger pessoas que se envolvam em experimentos científicos.
Fica bem nítido aqui o racismo ao extremo, por isso o título do artigo, e o preconceito por serem pessoas pobres. Vou alcunhar esse caso como “O pequeno campo de concentração”, e o pior num país democrático. As pessoas que foram vitimas dessa experimentação passaram da condição de sujeito para a condição de objeto, coisa. Não se levou  em conta que são seres humanos possuidores de razão e de sentimentos que apenas queriam ter o direito de viver bem. Acredito que esse caso soará como algo inédito para muitos dos leitores.

Créditos/ obras Consultadas:

VIEIRA, Sônia e HOSSNE, William Saad. Experimentação com seres humanos. Editora Moderna 2º Ed. São Paulo, 1987;

NOGUEIRA, Salvador. Ciência Proibida. Editora Abril, São Paulo, 2015.

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

René Girard (1923-2015)

por Leandro Morena

 

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No último dia 4 faleceu o filósofo, filólogo e historiador francês René Girard. Destacou-se por suas teorias que afirmam que o mimetismo é a causa da violência humana.  Esse conceito afirma que os seres humanos tendem imitar os desejos um dos outros, o que gera uma tensão social. No mundo acadêmico foi alcunhado como o novo Darwin das ciências humanas. Ele lecionou por muitos anos na Universidade de Stanford, tornando-se professor emérito, e foi à própria instituição que deu a nota de falecimento. Pela prestigiosa Academia Francesa (Academia Brasileira de Letras baseou-se nela) é considerado como um dos “40 imortais”. Publicou muitas obras  sendo que a primeira foi Mentira Romântica e Verdade Romanesca publicado no ano de 1961. Por ser adepto e defensor do cristianismo, Girard foi considerado por uns como sendo um filósofo conservador.

Algumas obras do filósofo:

 

·         Violência e o Sagrado, 1972;

·         Coisas Ocultas Desde a Fundação do Mundo, 1978;

·         Rota Antiga dos Homens Perversos, 1985;

·         Anorexia e Desejo Mimético, 2008.

Fonte:

G1

Folha UOL

André Glucksmann (1937-2015)

                                

por Leandro Morenaclip_image001

 

No último dia 10 faleceu o filósofo e ensaísta André Glucksmann. Ele pertencia ao grupo denominado: Novos filósofos. Filho de judeus ashkenazi austríacos, André estudou na École Normale Supérieure de Saint-Cloud. Quando jovem foi adepto do Maoísmo, depois ficou adepto do Atlantismo. Sempre foi considerado como um esquerdista, mas curiosamente apoiou o conservador Nicolas Sarkozy na eleição para presidente, mas a aproximação deste com o presidente da Rússia Vladimir Putin, fez com que o filósofo se distanciasse dele. André seguiu criticando Putin pelo seu autoritarismo. No final da década de 70 conseguiu ajuntar o filósofo Jean-Paul Sartre (1905-1980) que era da esquerda com o filósofo, considerado liberal, Raymond Aron (1905-1983) no qual foi se assistente no final da década de 60. Esse encontro deu-se pelo motivo da campanha a favor das pessoas que fugiam do comunismo no Vietnã. Também na década de 70, André rompe com o marxismo, pois na sua obra, lançada em 1975, denominada A cozinheira e o devorador de homens, faz uma crítica severa ao marxismo afirmado que essa ideologia produz campos de concentração, afirmação essa que gerou muitas críticas dos filósofos que são adeptos do marxismo. Foi um crítico arduo do totalitarismo e grande ativista dos direitos humanos.

Algumas obras do filósofo:

 

·         Os mestres pensadores, 1977;

·         La Troisième Mort de Dieu, 2000;

·         O discurso do ódio, 2004.

Fonte:

·         G1

·         Folha UOL

segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Filósofo Fausto Castilho (1929-2015)

 

por Leandro Morena

 

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Nesse ano a filosofia brasileira perdeu um de seus maiores pensadores, o filósofo, pesquisador, professor e tradutor Fausto Castilho. Fausto quando jovem mostrou a sua força de vontade, aos 17 anos foi aprovado no vestibular da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), mas acabou desistindo da graduação e o  motivo disso foi que o seu sonho era estudar filosofia em Sorbonne, situada em Paris.

            E foi com a ajuda dos escritores Oswald de Andrade e Sérgio Milliet que foram os protagonistas por convencer a família do filósofo a acatar essa idéia.

Em 1947, o sonho de Fausto realizou-se, chegou à França para estudar filosofia, e foi aluno de grandes pensadores como: Gaston Bachelard (1884-1962), Martial Gueroult (1891-1976), Ferdinand Alquié (1906-1985) e Henri Gouhier (1898-1994). Foi aconselhado pelo filósofo Merleau-Ponty (1908-1961), de quem foi grande amigo, e no ano de 1949 foi para Friburgo, Alemanha onde foi aluno do filósofo Martin Heidegger (1889-1976).

            Fausto Castilho retornou ao Brasil no ano de 1952 e foi lecionar na Universidade Federal do Paraná, na Universidade de São Paulo e foi um dos responsáveis pela criação da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) onde também lecionou, tornando-se professor emérito, e aposentou-se em 1997.

            Foi tradutor da obra “Ser e o Tempo” (primeira edição bilíngue) de Heidegger, onde possibilita o estudante ler o texto em português e fazer a comprovação com o texto original em alemão. O próprio Castilho afirmou: que são os alunos de filosofia que se beneficiarão com está edição. Traduziu também a obra “Manual dos Cursos de Lógica Geral” do filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804).

            Desde 1959 foi casado com Carmen com quem viveu até o fim. Não teve filhos.

Fausto mostrou-nos que nunca é impossível de se alcançar um sonho, por mais difícil que seja, com força de vontade e persistência, acaba tornando o sonho possível.

Fausto Castilho enriqueceu a filosofia brasileira e esse grande filósofo fará muita falta.

 

 

Fonte: Folha UOL

Stuart Mill (1806-1873): A Democracia

                                       

por  Leandro Morena                                                   

                A definição de democracia pelo entendimento do filósofo Norberto Bobbio (1909-2004):

...por democracia entende-se uma das várias formas de governo, em particular aquelas em que o poder não está nas mãos de um só ou de poucos, mais de todos, ou melhor, da maior parte...
                                                                             Trad. Daniela Beccaccia Versiani                                                                                                                                                                                                 
            Stuart Mill escreveu a obra: Sobre a liberdade, e nela o filósofo londrino afirma que a democracia é a melhor forma de governabilidade perante todas as outras formas de governo, embora cauteloso por viver numa monarquia. O filósofo ressalva, no entanto, que mesmo num sistema democrático, a liberdade pode ser ameaçada, como menciona Mulgan: das forças da conformidade social, isto é, a tirania da maioria. A preocupação de Mill nesse sistema de governo poderia vir extinguir a individualidade e conter as minorias. Mill é enfático em seus escritos por mostrar a importância da liberdade pessoal de um caráter individual que seja forte e com isso exercesse o encorajamento de seu crescimento, e Mill assegura que mesmo uma democracia não pode garantir a liberdade.
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Mesmo com essas objeções, Stuart Mill mostra-nos que a democracia é o melhor sistema. Em outra obra: Considerações sobre o governo representativo, ele afirma e defende uma maior participação política tanto em bases instrumentais quanto essenciais. Segundo Mulgan, instrumentais pode ser entendida como a defesa utilitarista padrão do livre mercado, ou seja, os cidadãos são os próprios juízes de seus próprios interesses.
            Stuart Mill afirma que uma democracia representativa é a melhor maneira de manter os que governam agirem com integridade e com isso trabalham nos interesses da maioria dos cidadãos. O filósofo é firme na ideia da democracia representativa, que se por acaso aparecesse um ditador do “bem” (algo impossível de imaginar) e este tirano fizesse de tudo pelos interesses da população, mesmo assim, a democracia ainda será a melhor forma de governabilidade.
            Para Mill, a democracia representativa é eficiente, faz com que as pessoas participem da vida política, e o cidadão se desenvolva por forma voluntária, atingindo as classes menos favorecidas e esta tende ficar incentivada para refletir e preocupar-se com a as questões do dia a dia, e o resultado disso faz com que esses cidadãos comecem desenvolver uma capacidade intelectual para se depararem com questões de maior relevância e tomarem decisões muito mais complexas.
                A democracia representativa permite também, como diz Mulgan:
 ...que alguns se especializem na complexa atividade governamental, e deixa os demais livres para dedicarem o seu tempo às coisas mais importantes na vida.
Trad.: Fábio Creder


Mill deixou bem especificado no seu pensamento político que ele não vê a política como algo mais importante da vida.
É importante frisar que para ter-se uma sociedade justa, livre e desenvolvida, a educação é a base de tudo. Ler o artigo do Osvaldo Duarte nesse blog: Democracia Republicana- Montesquieu.
O modelo usado pelo Brasil é a democracia representativa, se fossemos seguir a ideia de Stuart Mill, seríamos um país modelo, mas esse sistema tem falhado ao longo dos anos, pois nem sempre os representantes estão representando os interesses da população, pois representam os interesses de si mesmos, além de existir um distanciamento gigantesco entre o eleitor e o eleito.
            O Brasil é uma democracia jovem e é fato que num passado não muito distante o cidadão brasileiro não se interessava por política, pois havia um ostracismo evidente, os corruptos e corruptíveis ficavam impunes. O cidadão não se preocupava com o passado de quem ele elegeu ou por tantas decepções com o eleito, o cidadão perdia a esperança. Hoje o cidadão brasileiro está mudando, o brasileiro saiu da “Caverna de Platão”, pode-se afirmar que, ainda um pouco tímido, ele começa interessar-se pelo andar da política. Manifestam-se pelas redes sociais ou reúnem-se em manifestações físicas, exigindo da pessoa que eles elegeram que de fato cumprem o que foi colocado no plano de governo. O cidadão brasileiro não está mais vulnerável à corrupção, exigem que os corruptos sejam presos, além de saber o passado do candidato que eles pretendem votar, com a lei da ficha limpa, mostra-nos que a democracia está fortalecida pela união dos cidadãos. Não é difícil ver hoje, o que no passado foi mais raro perceber, um grupo de estudantes, ou um grupo de amigos, ou de pessoas de idade, ou e de classes sociais diferentes, debatendo política, parece que o cidadão brasileiro começa ver a importância de ter o conhecimento daqueles que o representarão e do entendimento da situação política, e com isso exigem que o país possa vir a ter um futuro promissor, e fortalecem essa democracia que jamais poderá ser derrubada por um golpe como no passado, pois o cidadão informado, unido e encorajado, jamais será vencido.
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            Pode ser que num futuro não muito distante a democracia representativa no Brasil seja seguida como foi elaborada na teoria, e teremos representantes que estejam focados no que realmente o povo deseja.

Créditos:
Obras consultadas:

BENTHAM, Jeremy e STUART MILL, John. Os Pensadores. Editora Abril, 2º Ed., São Paulo, 1979.
MULGAN, Tim. Utilitarismo. Tradução: Fábio Creder. Editora Vozes, Rio de Janeiro, 2012.
BOBBIO, Norberto. Teoria geral da política: a filosofia política e as lições dos clássicos. Trad. Daniela Beccaccia Versiani. Campus, Rio de Janeiro, 2000.


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segunda-feira, 24 de agosto de 2015

A informação na formação moral humana – Sêneca


Sêneca – Carta 88 – As Artes Liberais.
por Osvaldo Duarte

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 Os gregos tinham por ignorância (agnoia) algo feio (aisxoç), uma deformação da alma que deveria ser alijada através do ensinamento (didaskalikh).  A Arte (texnh) surge como possibilidade de um ensinamento que pode ou não dirigir para um saber, na medida em que tenha um caráter universal. A Paidéia (paideia), traduzida como formação, e ainda  pela qual os sofistas foram guiados, era  educar com vistas a falar  sobre todas as coisas.
À sua época, Sêneca, na epístola 88 retoma esta questão e, como bom estóico, sua crítica têm matizes da Moral, a saber, todas as ações humanas devem ser voltadas para o aperfeiçoamento do homem enquanto humano, tornando-o virtuoso.
Considerando Posidónio, o filósofo estóico informa que há quatro tipos de artes: as vulgares e inferiores, as recreativas, as educativas e as propriamente ditas, liberais.
Por artes vulgares, entendiam as manuais, fabricação de objetos (artesãos), as recreativas, seriam aquelas cujo objeto é o prazer dos olhos e ouvidos (Teatro), educativas eram as artes que tinham algo de comum com a liberais, que os gregos chamavam de “enciclopédicas”, e liberais, as que são verdadeiramente livres, cujo objetivo é a virtude.
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Ao contrário de alguns que viam no estudo liberal uma maneira de formar homem de bem, Sêneca afirmava que não era esse tal propósito, pois os mestres sequer ensinavam a virtude e, tampouco, poderiam transmiti-las.
“O que há de liberal, pergunto eu, nestes indivíduos que vomitam em seco, que quanto mais engordam o corpo mais deixam o espírito macilento e letárgico?”
Sêneca entendia por virtude:

A Coragem;
A lealdade;
A temperança;
A simpatia humana;
A modéstia;
A moderação;
A frugalidade ou parcimônia;
A clemência.

 Ao compreender o seu tempo, sua análise torna-se extemporânea na medida em que dá aos que se interessam por este tema, a possibilidade de um olhar atual, a saber, a quantidade de informação e, principalmente, da sua utilidade na formação humana, . Para ilustrar recortamos um exemplo da Carta 88:
“O gramático Dídimo escreveu quatro mil livros: eu já teria pena dele se se tivesse limitado a ler tanta bagatela! Num dos livros investiga qual a Pátria de Homero, noutros qual foi a verdadeira mãe de Eneias; noutros se Anacreonte se entregou mais à vida de prazer ou à bebida; noutros se Safo foi prostituta; em suma, coisas que se a soubéssemos, deveríamos esquecer.”
Ainda assim...
“(...) apesar de tudo sempre é melhor saber uma coisa supérflua do que não saber nada!"
E assim conclui o nosso autor:
Tenho de saber tudo isso? O que posso ignorar então?”
“Saber mais do que o necessário é uma forma de intemperança.”

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As Artes Liberais, segundo o nosso filósofo, são assim chamadas, por serem dignas de um homem livre, mas o único estudo liberal, por ser elevado, magnânimo e enérgico é o da sabedoria.
“A sabedoria cinge-se às ações, não às palavras (...). A sabedoria é algo de grande e de vasto; exige para si todo o espaço; temos de nos debruçar sobre o divino e humano, sobre o passado e o futuro, sobre o transitório e o eterno, sobre o tempo."
Devemos aproveitar melhor o nosso tempo!
“Já te dispuseste a pensar quanto tempo te é roubado pelos problemas de saúde, pelos deveres oficiais, pelos teus deveres particulares, pelos teus deveres quotidianos, pelo sono? Mede a duração da sua vida: não cabe lá muita coisa.”
Se os estudos liberais não tornam os homens virtuosos, não conduz a alma humana à sua plenitude, por que deveríamos então, nos instruir em tais estudos?
Para responder esta questão, devemos ter em mente que o que está em jogo aqui, é a téchné como possibilidade de formação moral; Sêneca, enquanto filósofo estóico, está olhando noutra perspectiva, isto é, está voltado para a dimensão moral, e não vê aí qualquer utilidade dos estudos liberais.  Ainda que a arte liberal não possibilite ao homem o aprendizado da virtude, sequer o torna melhor enquanto humano, é importante em outros aspectos, máxime nas artes manuais (fabricação de objetos para uso cotidiano).
 “Queres saber o que eu penso das “artes liberais”: não admiro, nem incluo entre os bens autênticos um estudo que tenha por fim o lucro.”

Créditos/Obras consultadas:
HEIDEGGER, M. Platão: O Sofista. Trad. M. A. Casanova. Forense Universitária. Rio de Janeiro, 2012.
PRIETO, M. H et al., Índices de Nomes Próprios Gregos e Latinos, Lisboa: Fund. Calouste Gulbenkian,1995.
PETERS, F. E., Termos Filosóficos Gregos. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1977.
SÊNECA, L. A., Cartas a Lucílio. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2009.

domingo, 21 de junho de 2015

O pensamento de Hípon

por  Leandro Morena

Pouco se sabe da vida do filósofo grego Hípon, mas provavelmente foi no final do século V a.C. que esteve em atividade. O próprio filósofo Aristóteles (385 a.C.- 322 a.C.) considerava-o como um filósofo de pensamento medíocre. Apenas poucos fragmentos sobraram dos seus escritos, mas o bastante para inseri-lo na história da filosofia como um pensador e tanto.

Na mesma linha do pensamento de Tales de Mileto (624 a.C.- 546 a.C.), Hípon acredita que tudo tem origem da água, o próprio fogo provém da água. Embasado nisso, o filósofo cria uma argumentação acerca do úmido/seco. Segundo o filósofo, a umidade tem como o princípio a água, por sua vez, o calor vive da umidade, referindo-se a todas as criaturas vivas, as sementes e a própria comida, pois a degustação dela torna-se boa por ter umidade. As coisas mortas são ressecadas justamente pela falta da umidade.

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Para explicar a saúde do corpo, Hípon baseia-se na própria dicotomia úmido/seco, e analisa que somos possuidor de uma umidade que se adapta bem, gerando algo benéfico, segundo Barnes, a capacidade de perceber e em razão da nossa existência. Quando a umidade encontra-se num nível demasiado bom, o ente, por sua vez, é saudável, caso contrário, quando ocorrer um desequilíbrio na umidade, gera o ressecamento e com isso perece. Hípon afirma que os homens idosos faltam-lhes umidade, por esse motivo são secos e a percepção deles é comprometida por esta falta.

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Em outro fragmento, o filósofo afirma que a umidade pode sofrer alterações que podem levar a um desequilíbrio, ou seja, quando ocorrer excesso de frio, ou  excesso de calor, acaba gerando as enfermidades, ele não especifica quais são essas enfermidades. De um modo geral, tem que existir o equilíbrio no frio e no calor para que a umidade possa ser benéfica ao ente.

Observamos que tudo que faz parte da natureza tem que ter um equilíbrio, o corpo humano e dos animais, as plantas, o ar, o fogo, a água, um pequeno desequilíbrio gera uma condição negativa de proporções catastróficas.

A meu ver, o pensamento de Hípon foi uma “fagulha” para o desenvolvimento da lógica, embora seja com Aristóteles que a lógica fosse disseminada, aqui podemos observar que Hípon criou um “Sistema Dicotômico” que serviu de base para os filósofos posteriores.

Créditos: Obra consultada

BARNES, Jonathan. Filósofos Pré-Socráticos. Trad. Julio Fischer. Ed. Martins Fontes, São Paulo, 2003.