por Osvaldo Duarte
“podemos e não podemos mergulhar duas vezes no mesmo rio”.
Ainda na carta 58, Sêneca, através de Platão, faz uma leitura do fragmento DK49a; onde, Platão não considerava entre os seres dotados de existência própria “o ser” existente, isto é, aquele que é percebido por afecção, pois está num contínuo devir, sofrendo constantemente acréscimos ou mutilações.
O homem na velhice não é idêntico ao que foi na juventude; nem mesmo é, pela manhã, o que foi no dia anterior. Com efeito, nossos corpos fluem com rapidez no tempo como a corrente dos rios.
Não devemos temer a morte, pois cada momento é resultado da morte anterior do nosso corpo. O homem é fraco, efêmero e vive entre coisas vãs, as deseja como se houvesse permanentemente possuí-las, num mundo em que tudo existe para serviço dos sentidos que apetece, aguça e excita a vontade. Essas coisas são imaginárias e mudam de aspecto com o tempo e nada possuem de estável e permanente. Tudo o quanto vemos acompanha o fluir do tempo e não permanece idêntico. Lúcio Aneu nos aconselha:
“Desprezemos, pois, todas as coisas que tão pouco preciosas são a ponto de a sua própria existência ser duvidosa.”
Sêneca nos diz que, enquanto fala sobre as mudanças, ele mesmo já mudou.
“Este é o sentido da frase de Heráclito: “podemos e não podemos mergulhar duas vezes no mesmo rio”. O nome do rio permanece o mesmo, a água, essa já passou adiante. Num rio o fenômeno é mais sensível aos olhos do que num homem, mas não é menos rápido o curso do tempo em nós; por isso me espanta a loucura que nos leva a tanto amarmos essa coisa fugidia que é o corpo, e temer morrermos um dia quando cada momento é a morte do estado imediatamente anterior.”
Créditos:
SÊNECA, L. A., Cartas a Lucílio. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1992.
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