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Pansophia

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quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Alegoria da Caverna

Sombra e luz em Platão – A Leitura de Lebrun


por Osvaldo Duarte
Em um dos discursos mais conhecidos de Platão - “A Alegoria da caverna”, mestre Lebrun examina o significado de iluminação, isto é, saída das trevas; para tal empresa divide aquela história em quatro episódios:
I) Os prisioneiros, acorrentados, imobilizados, não podendo mover a cabeça, observam o desfile de marionetes através das sombras projetadas na parede. Eles tomam por seres verdadeiros estas marionetes e creem ouvi-las falar, quando na verdade são as vozes dos carregadores.
II) Um dos cativos é liberto e fica deslumbrado pela luz do fogo, é forçado a olhar as marionetes que passam por cima do muro.
III) Retirado do antro fica cegado pela luz sendo incapaz de observar os seres reais. Aos poucos seus olhos vão se acostumando, observa então, as sombras e os reflexos, depois os próprios seres que projetam estas sombras.
IV) Seu olhar eleva-se em direção ao Sol. Conclui que esse produz a vida e as estações, que é a “causa” de tudo que ele via quando estava preso na caverna - para onde é forçado a retornar.
A caverna significa uma educação (paideía), para os prisioneiros as sombras são as próprias coisas e a luz da fogueira não é percebida como luz artificial. Somente quando liberto, vê as marionetes iluminadas pela luz da fogueira e consegue distinguir a sombra da realidade; mas está ainda longe de conhecer a verdade. Como ainda não vê os carregadores que passam embaixo do muro, ignora que as marionetes são apenas imagens de homens e de animais manipuladas por operadores não discernindo aparência da realidade. Somente ao sair da caverna é que poderá ver o que se passava do outro lado do muro, passando a distinguir as imagens dos seres vivos dos próprios seres vivos, travando conhecimento. Neste processo o liberto fica deslumbrado pelo fluxo de luz, durante certo tempo contemplará as sombras e os reflexos das coisas sensíveis, mas ainda confundirá o que chamamos de “coisas reais” com as suas imagens. No IV episódio ele verá o Sol de frente, mas ainda não será o fim da aventura.
Não é apenas pelo fato de ver o Sol que o torna superior aos demais cativos, mas porque compreende que é o Sol que garante a existência do mundo e de todos os seres vivos, dos artefatos, do fogo que acende e das sombras projetadas. É nesse momento que ele, enfim, tomou consciência de toda situação e pôde figura-la. Nesse instante a luz o inunda, pois não há mais nenhuma confusão entre aparência e realidade. Lebrun lembra que ao longo desta viagem em direção ao Sol, o liberto precisou distinguir a própria coisa daquilo que ele acreditava ser a própria coisa na etapa precedente.  Assim, continua Lebrun, cada experiência contém autocrítica da experiência anterior.
 Mas o que é a saída das trevas? Para Lebrun, a iluminação significa não uma simples ignorância, mas a ingenuidade, o que segundo ele, é completamente diversa. Platão percebe a dificuldade em dissociar a aparência da realidade, a imagem do seu original. Para Lebrun a questão não é que os homens tenham de se relacionar com as imagens: é que não sabem bem o que são imagens. A razão desta cegueira continua Lebrun, é mais simples e mais profunda, pois os homens ainda não pensam por meio da separação “aparência/realidade”, tendo de certo modo razão, pois, na vida diária a aparência não é oposta à realidade. Isso é bom, o viver sem a desconfiança de que não sabem ser a aparência, e que essa ingenuidade jamais seja completamente dissipada. Aquele que desconfiasse de que o aparecer não é senão a aparência, jamais de apaixonaria ou então seria eternamente presa ao ciúme. Essa ignorância relativa a nosso lugar é indispensável à vida.
É justamente esta ignorância que é dissipada pela luz platônica. O prisioneiro é arrancado do seu estado de inconsciência. Ele ignorava que vivia acorrentado em um antro, não tinha a menor ideia de que seu “saber” era um falso saber. Daí a resistência, a má vontade quando é constrangido a aproximar-se das marionetes e é obrigado a dizer o que é (quando é submetido ao exame dialético). A formação que lhe é imposta, não o obriga apenas em perceber as paisagens, mas também em fazer com que visite um domínio desconhecido. O importante é que o lugar em que outrora vivia, agora é completamente outro. Quando retornar o viajante não será mais o mesmo, seus antigos companheiros não o “reconhecerão”.

A ignorância que nos faz envergonhar é muito específica: cegueira acrescida de estupidez. A esta ignorância, Lebrun usa a palavra grega amathía: nada saber e crer que sabe. Para sair desta amathía é preciso “virar a cabeça”,“violentar-se”, deixar que o educador use de violência. Não basta apenas convida-los a observar melhor: é preciso obrigar aqueles que são capazes (estes não muitos) a olhar alhures.
 
Créditos
LEBRUN, G. A Filosofia e sua História, Cosacnaify, 2006.


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