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Pansophia

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sexta-feira, 23 de março de 2012

O logos como discurso, segundo a sofística gorginiana

por Osvaldo Duarte
Górgias, filho de Carmântides, nasceu por volta do ano 490-485 em Leontinos na Sicília. Segundo testemunhas, Górgias teve uma vida longa, morrendo aos 109 anos; o motivo desta longevidade é que, segundo alguns, permaneceu solteiro, sem encargos familiares ou qualquer preocupação que se impõe a um homem casado, além de possuir uma excelente saúde pela dieta frugal e uma vida afastada dos prazeres.
Górgias, o Leontino, chegando a uma extrema velhice, e aproximando-se do término da sua carreira, foi acometido por uma doença que lhe causava um adormecimento quase contínuo. Um de seus amigos, tendo ido visitá-lo, perguntou-lhe como ele se encontrava:

“-Sinto –respondeu -lhe Górgias-que o sono começa a entregar-me a seu irmão”.
                                                                                                          
Górgias é um exemplo de sofista itinerante, pois viajou por todo mundo grego: Olímpia, Delfos, Beócia, Argos, Tessália, entre outros lugares; tinha muita celebridade entre os gregos. O sofista costumava aparecer em público sempre com túnicas de cor púrpura.
O Elogio de Helena é, provavelmente, um exercício utilizado por Górgias na sua atividade como professor onde procura fazer apologia assente numa estrutura mítica, tendo a pretensão de mostrar a inocência de Helena, acusada de ser o motivo da guerra de Tróia. O autor procura mostrar as razões que a levaram a seguir Páris, sendo que tais motivos (a necessidade do destino, a violência física e a persuasão do discurso i.e. o logos enquanto discurso) a inocentam de tal acusação.
“É dever do mesmo homem dizer corretamente o que é devido refutar [o que se disse erradamente. Importa refutar] os detratores de Helena (...). Portanto, eu quero, desenvolvendo o discurso segundo certo raciocínio, libertá-la da acusação que a difamou e, ao demonstrar que os detratores mentem e ao mostrar a verdade, pôr termo à ignorância”.
Os excertos que nos interessam, são os que se referem à persuasão do discurso.
O discurso (logos) exerce na alma ações divinas provocando afecções. O logos tem o poder de suprimir o medo, cessar a dor, provocar alegria e intensificar a paixão. O discurso é comparado à poesia, à magia e aos medicamentos.  Assim diz o Sofista de Leontinos:
“(...) O discurso é um tirano poderoso que, com um corpo microscópio e invisível, executa ações divinas. Consegue suprimir o medo e pôr termo à dor e despertar a alegria e intensificar a paixão”.
A poesia como discurso:
“Considero e denomino toda a poesia um discurso com medida. Daqueles que a ouvem apodera-se um arrepio de terror, uma compaixão comovida e uma saudade nostálgica; pelas palavras, a alma experimenta um sofrimento particular em relação ao sucesso e infortúnios de acontecimentos e de pessoas que lhe são alheios”.
O discurso como magia:
“Os encantamentos inspirados pelas palavras levam ao prazer e libertam da dor. Na verdade, a força do encantamento, misturando-se com a opinião da alma, sedu-la, persuade-a e a transforma por feitiçaria. Descobriram-se duas artes de feitiçaria e magia que são, uma os erros da alma e a outra os enganos da opinião”.
”(...) Se, de fato, todos possuíssem a respeito de tudo memória do passado, do presente e previsão do futuro, o discurso não seria exatamente igual; mas agora não lhe é fácil nem recordar o passado nem ponderar sobre o presente nem prever o futuro. Deste modo, a maior parte dos homens, sobre a maior parte dos assuntos, oferece à alma opinião como conselheira. Todavia, a opinião, que é vacilante e insegura, lança as situações vacilantes e inseguras os que dela fazem uso”.
O discurso comparado às prescrições de medicamentos:
“A força do discurso em relação à disposição da alma é comparável às prescrições de medicamentos em relação à natureza dos corpos. Assim como os diferentes medicamentos expulsam do corpo os diferentes humores e a uns põe termo à doença e outros à vida, assim também entre os discursos uns entristecem e outros alegram, uns amedrontam e outros incutem coragem nos ouvintes, outros há que envenenam e enfeitiçam a alma com uma persuasão perniciosa”.
Créditos
ELIANO. Histórias Diversas. Tradução: Regina Schopke  e Mauro Baladi. São Paulo, Martins Fontes, 2009.
LAÊRTIOS, D.. Vidas e Doutrinas dos Filósofos Ilustres.  Tradução: Mário da Gama Kury. Brasília, Editora da UnB, 2008.
SOFISTAS. Testemunhos e Fragmentos. Tradução: Ana Alexandre Alves de Sousa e Maria José Vaz Pinto. Lisboa, INCM, 2005.

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