por Osvaldo Duarte
“O Estado que fala a sua própria linguagem, para com os deuses e os homens e age de acordo com essa linguagem, prospera sempre e conserva-se, mas emita ele uma outra e perecerá.”
Embora não se tenha chegado ainda a um comum acordo sobre a autenticidade da quinta carta de Platão, é certo que esta epístola figura no Corpus Platonicum e, possivelmente, temos aí, um dos textos mais tardio de Platão.
Esta missiva tem como destinatário, Perdicas, um general macedônio. Trata-se de uma carta breve, curta, que mostra de maneira implícita, ao menos sob o nosso ponto de vista, duas questões, a saber, do engajamento do filósofo como conselheiro político e do papel da filosofia. A sua possível apocrifia, não suprime a riqueza e tampouco a possibilidade de nos levar a uma reflexão sobre qualquer sistema de governo.
Platão se propõe a dar um conselho, mas não um conselho qualquer, sem importância, mas um hieran simboulen – conselho sagrado, tal é a importância que o velho Mestre dá à Política.
Cada forma de governo, cada politeía, tem a sua própria phonê por natureza, assim como se dá com certos animais, tanto a democracia, como a oligarquia, a monarquia ou a aristocracia, tem a sua própria voz, a linguagem que lhe é única por natureza.
Se cada politeía, isto é, se cada Constituição nas suas diferentes formas de governo tem a sua própria phonê, é necessário que o governante a descubra e fale de acordo com a própria essência da sua politeía.
Isto não é tarefa fácil, adverte Platão à sua época - embora muitas pessoas pensassem distinguir as diferentes phonês, com raríssimas exceções, estavam longe de compreendê-las.
Ao comparar a politeía a um “animal”, podemos por analogia, dizer que é necessário que se compreenda os desejos e a cólera dos cidadãos e, somente assim, o governante conseguirá conduzi-los.
Na República, ao fazer críticas aos Sofistas, Platão também cita o “animal”.
Mas não basta falar a mesma phonê da politeía, é necessário que o governante paute suas ações de acordo com ela. Se a conduta do governante for de acordo com a linguagem, a politeía prosperará.
Se a politeía imitar a phonê de outra politeía ou adotar uma linguagem que lhe seja estranha, perecerá.
Se o conselho político de Platão nos servir, nós que defendemos no momento a tal pujante democracia brasileira sem atentarmos para a linguagem do governo, corremos sério risco de fazer apologia a um mero simulacro!
Créditos/Obras consultadas:
FOUCAULT, Michel. O governo de si e dos outros. Trad. Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 2010.
PLATÃO. A República. Trad. Maria Helena da Rocha Pereira. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1993.
PLATÃO. Diálogos, Fedro, Cartas, Alcebíades Vol. V. Trad. C. A. Nunes. Pará: Universidade Federal do Pará, 1975.
PLATÃO. Cartas, Trad. Conceição Gomes da Silva e Maria Adozinda Melo. Lisboa: Editorial Estampa, 1989.
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